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Obrigada.


sábado, 24 de dezembro de 2011

Enkel

Tinha, lá pra lá, em um lugar que nem tinha nome de tão longe, uma cidade pequena. Não viviam mais de algumas centenas de pessoas, mas era o suficiente. Suficiente para o mundo acabar ali mesmo. Era meio precária, cabanas tortas no meio do morro, algumas vacas e hortas em seus próprios terrenos. Não que cada pessoa tivesse um próprio território marcado, porque era tudo de todo mundo, tudo amigável porque o pecado não tinha ainda tocado a alma daqueles seres humanos tão distantes... Mas por pouco tempo.

Há alguns anos, Elizabeth, uma mulher pequena e loira, por causa de um estupro nunca contado pra ninguém, tinha dado a luz a uma menina igualmente loira, dos olhos azuis e das bochechas rosadas. Chamaram-na de Enkel. Seria a experiência mais pura, mais linda e perfeita, mas havia algo errado com a garota. E com a ajuda do pouco tempo e pouco amor vindo da mãe, ela não se portava normalmente. Nos primeiros anos, a mãe da menina estranhava o fato de Enkel não chorar. Não chorará na hora do parto, e nem depois. Simplesmente permanecia quieta, com os grandes olhos azuis claros sempre olhando fixamente pra face de quem a pegasse no colo, ou olhando para todos os cantos do quarto onde estava.

Ao começar a andar, Enkel quebrava tudo ao seu alcance. Não sem querer, simplesmente pegava as coisas e quebrava da maneira que achava mais prudente. E gostava de quebrar coisas que tinham algum valor para os outros. Parecia que sabia como fazer os outros sofrer. Várias vezes o marido de Elizabeth espancou Enkel, castigou-a. Mas nenhuma lágrima, só o rosto infantil, olhando o homem. Ele se sentia culpado, todas as vezes, mas não via outras alternativas. Nessa época não passava dos três anos. E por mais que a mãe dela tentasse, ela não falava. Ficava quieta, com os lábios cerrados, apenas olhando-a e a mãe implorando pra que ela falasse “mamãe”.

Com a idade de sete anos, as coisas começaram a ficar um pouco mais sérias. Quebrar janelas já não era dos seus passatempos favoritos, mas sim matar pequenos animais. Constantemente achavam-na em galinheiros coberta de sangue e penas de galinha. Matou uns três gatos, vários ratos, qualquer pássaros descuidado. A primeira vez que Elizabeth viu a menina sorrir foi quando tinha dez anos de idade. Ela estava com a machadinha de lenha nas mãos, e o cabrito da família estava esquartejado.

Até tentaram colocar a pequena junto com outras crianças em uma escolinha infantil. Mas ela sempre estava perseguindo as outras meninas e meninos, batendo, puxando os cabelos, mordendo as crianças até que o sangue saísse grosso entre os cortes dos dentes de Enkel.

Aquilo foi a gota d’agua.

Todas as pessoas da cidade estavam amedrontadas pela a alma Enkel. Os mais velhos diziam que ela era o pecado em carne e osso, e outros diziam que era a filha do próprio Belzebu. Nenhuma família dormia sossegada, nenhuma criança brincava na rua, e constantemente os cabelos loiros avoaçados pelas ruas atormentavam os moradores. Elizabeth teve de tomar medidas drásticas e acabou por trancar garota no porão de dois metros por quatro que tinha em casa. Só abria a porta pra alimentar a menina. Alguns padres, exorcistas, benzedeiros e até feiticeiros (nos momentos de mais fúria de Enkel, quando se podia ouvir ela se debatendo contra as paredes do porão) foram convocados, mas nenhuma reza, mandinga ou magia acalmava a menina. Ela só saia de lá uma vez por mês, quando precisavam de ajuda de pelo menos cinco homens adultos para amarrá-la e arrastá-la para a igreja.

Aos 17 anos, com uma inteligência incomparável para qualquer pessoa residente naquela vilinha, a fúria de Enkel estava cada vez maior. E piorava. Entendia o medo deles, e isso fazia a sorrir, e o ódio nunca explicado, e a vontade de matar, e a vontade de provocar os outros, de sangue, de ser dona da dor só crescia. Uma vez, no dia da igreja, foi jogada de costas contra a mesa da cozinha enquanto era dominada. A mão dela escorregou rapidamente e uma faca foi parar debaixo da saia. 

Alguns dias depois, quando seus malditos pais saiam para ir rezar por sua alma, ela tentava quebrar o cadeado pela fenda que tinha entro as madeiras da parede e a da porta. Seus pais saiam juntos de casa uma hora por dia, então já estava com o cálculo feito na sua cabeça. Mas não foi necessário. Não demorou mais de vinte minutos para desvendar o ângulo certo de virar a faca para o cadeado velho ceder. Se foi com ajuda da raiva ou de algo mais, não se sabe. Estava livre. 

Pulou a janela, com suas roupas sujas e fedendo, duma mistura sangue e urina seca, com os cabelos desgrenhados de ficar 24 horas por dia num local pequeno e úmido. Com metade da vila na igreja, as ruas estavam vazias e foi fácil de roubar de um varal uma calça e camisa de menino e correr em direção da floresta que cercava a vila. Vestiu as roupas, não com muita dificuldade, pois apesar de ser roupas de criança, Enkel nunca desenvolvera muito. Com galhos finos trançados e amarrou os cabelos em um rabo de cavalo. Correu a noite toda. 

Não demorou muito pra ter que se meter mais pra dentro da floresta, pois os homens estavam atrás dela, gritando seu nome, suplicando para que aparecesse. Mas sabia que no fundo nenhum deles queria que ela aparecesse, seria uma benção se sumisse de vez pra sempre, não é mesmo? Todos estavam apavorados com a ideia de que a o demônio loiro voltasse. Ela só não atacou naquele momento pois vira armas. Esperaria. 

Enquanto os homemns adentrava a floresta e as mulheres e crianças se abrigavam em suas casas, Enkel deu a volta na cidade, e entrou de volta nas suas ruas desertas e de pouca iluminação. Andou em direção da igreja. Entrou, sujando o piso de terra molhada, com a imagem de cristo em uma cruz acima do altar, lhe fitando com o olhar triste. Parecia saber que aquela menina não tinha mais alma pra ele, e nunca teve. Ela sorriu, com os dentes escancarados para aquela estátua que não tinha nenhum significado para ela. 

Com as mãospequenas, derrubou propositalmente algumas velas que provavelmente tinham sido acesas em piedade de seu ser. O fogo se espalhou rápido.  Andando de costas para a porta e olhando o as chamas se espalhar com facilidade, saiu e sorriu. Umedeceu os lábios, e quase que em um piscar de olhos a igreja toda ardia, labaredas amarelas e vermelhas, vorazes e cheia com a fúria de Enkel.

A cidade ia despertando de seus pesadelos, pra viver um real. Pouco a pouco algumas pessoas começaram a sair de suas casas gritando, pedindo ajuda a Deus, e desesperadas. Logo havia uma multidão as costas da garota loira, que não se virou, mas tinha em seu rosto o sorriso do próprio diabo. Se debatendo entre a multidão até chegar à frente estava Elizabeth.

"Enkel!" Gritou a mulher ao chegar à frente de todos, mas ficou a uma distância de cinco metros da filha. A menina se virou, seus olhos cintilavam. 

"Mamãe," soou debochada, e a mulher caiu de joelhos ao ouvir pela primeira vez a voz do seu bebê. A garota riu e se aproximou da mulher de joelhos, puxando-a pelos cabelos pra mais perto do fogo. 

A multidão se mexia a cada movimento de Enkel, mas ninguém fazia nada. Era como a última dança. Ninguém tinha coragem de falar, até parece que tinham se esquecido como se andava, ou fazia qualquer coisa. "Por quê? Por quê?" Gritava a mãe desamparada enquanto a filha a arrastava pelos cabelos pra mais perto da igreja. Parecia ter uma força descomunal. Jogou a no chão, fazendo um pouco de poeira levantar. Com toda a fúria quente no peito, Enkel falou. No momento pareciam apenas palavras baixas só para a mãe, mas todos os aldeões juraram ouvir como se fossem sussurros dentro dos próprios ouvidos.

"O diabo mandou lembranças da onde eu vim, e disse que não se esqueceu dos teus pecados."

Todos olhando Enkel, Enkel olhando todos, sua mãe chorando fracamente. Ela virou as costas ao povo e foi entrando na igreja em chamas, devagar, tranquila, a fúria queimada.

Houve boatos por anos sobre essa história, sobre a roupa que ela usava de verdade, que na verdade ela nem era loira, que a mãe dela não tinha esse nome, que algumas pessoas desmaiaram enquanto ela falava, ou até que morreram. Mas a frase é sempre a mesma. O nome é sempre o mesmo.

O porão, o sangue e o fogo.

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

A luz que a lua não tem

E estava ali lua, parada. Minha alma quase sempre inquieta, acalma. Meu pés frios, esquentam. Minha alma derrete, é o verão. Mais uma palavras no papel, um pé na frente do futuro mas não pra seguir, sim pra tropeçar. 

E a lua amarela, estática, me olhando. 

Sou tão lua quanto ela própria. Sozinha, precisando de uma iluminação que eu nunca fui capaz de produzir por mim só ser. Preciso de ti como todas as outras coisas que não tenho. Preciso um pouco mais de mim, um pouco mais de não pensar demais.

Mais uma vez sozinha. 

sábado, 10 de dezembro de 2011

Um dia qualquer

Segunda-feira, um tédio total. O sol resolveu matar todo mundo hoje. Ninguém prestando atenção em nenhuma palavra que a palestrante falava, tanto que até ela se perdeu várias vezes, e não se achava. Gaguejava bastante, provavelmente a primeira vez que fazia aquilo, mas isso não era problema de ninguém. Dia errado pra ela começar, muito quente. Quem diria que depois dali ela beberia tanto o seu fracasso e acabaria em um hospital em coma alcoólico. Mas isso não era problema de ninguém dentro daquele do salão. Cada um tinha seus próprios problemas.

O ar estava quebrado, e os ventiladores portáteis que trouxeram não eram suficientes. Uma menina de cabelo cacheada estava grávida de poucas semanas, e batucava o lápis na mesa freneticamente. Mas isso não era problema de ninguém, além dela e do loirinho do fundo da sala, que roía as unhas. O pai.

Outra fungava e espirrava freneticamente, gripada em dezembro com os termômetros 39 graus, talvez 40. Morreu uns dias depois da palestra. Mas nem foi da gripe, atropelada mesmo. Mas isso era um problema de ninguém ali no salão.

Tinha um cara, chamado... Ninguém sabia o nome dele na real, mas chamavam ele de Jones. Jones dormia em todas as aulas, todas as palavras, o intervalo inteiro. Um vagabundo visto pelos outros dali, babando na classe em cima dos próprios livros. O que ninguém sabia é que ele trabalhava a noite toda pra sustentar a mãe viciada e a irmã menor, tinha no máximo quatro horas de sono decente e ainda tinha que estudar absurdamente mais do que todos em sua volta para manter a bolsa naquela maldita faculdade. 

Naquele calor que me faz crer fielmente que o inferno era ali, eu não tinha nenhum problema. Eu achava que tinha, vários. Tipo as contas, os amores, mas os meus eram menor. Eu era menor. Bem pequeno. E no final, todo mundo dentro do seu próprio mundo de problemas, crescendo, chorando, desistindo e morrendo. 

 Mais morrendo do que qualquer coisa.

domingo, 4 de dezembro de 2011

Obsoleto

- Toda a sua negação não vale um centavo! Eu me lembro bem da vez que tu escreveu, e disse, e sentiu que me amava. Você pode enganar todo mundo, menos a mim.

- Tanto faz.

- Da onde que veio toda essa indiferença? E pra que essa indiferença? Tu costumava a me amar, e ler os teus poemas pra mim. Pra que isso tudo agora?

- Sei lá.

- Sei lá? SEI LÁ? Porra, Luiza.

- É, sei lá.

- Caralho. Eu achei que tu me amava.

- Eu também achei.

Coçou o nariz.

- Vai embora.

- Eu já fui faz tempo.

Daí se beijaram.

E começou tudo de novo. Ela se afastou, ele ficou puto, ela volta, e ele acha que vai dar certo. Mas nunca dá. Sempre dá.

- Até quando, Luiza? Até quando?

Ela traga o cigarro lentamente, e sorri com os olhos semi-cerrados.

-Pra sempre.

E ri.

Cruel

Aquela lanchonete, do fim da rua. Tão perto e tão longe.
E tu decidiu que ia se encontrar lá.
Lá com outro alguém, que não eu, que tão distante.
E eu?
Onde eu estou?
-
E eu que só tinha um coração,
me sinto um tanto afundando na lama.
Agora ando pelas ruas esperando que alguém me encontre,
alguém que não é real, ou que não existe.
A culpa é sua.
-
Chora.
E todos seus suicídios, e todos os meus.
Eu vou tentar mais umas vez, vem comigo.
Olha só meu peito aberto, toda a vergonha escorrendo entre meus dentes.
-
As mãos em ti não são as minhas.
As minha mãos não são as minhas.
As suas mãos, cadê?
Cocaína.
E teu sorriso, aberto, maniaco.
E teu choro, sofrido, desesperado.
São 5 e meia da manhã.
-
E então eu morri na praia.
e você feliz na tua casa de campo,
com seus filhos puxando sua saia rodada.
Eu afogado.
Eu morto.
Podia ter sido diferente.

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

I do

O salão não é tão grande quanto queríamos, e nem todos os queridos estão por perto. Mas os que estão, são importantes. Essa meia luz, e a nossa música tocando, tu ajeitando meu cabelo desjeitosamente, todo mundo em volta, alguns sentados, alguns de pés, muitas câmeras e flashes. Minhas pernas estão meio bambas, como na primeira vez que te vi.

Teu sorriso é tão lindo, combinando com meus olhos marejados. Meu vestido preto, longo. Se lembra quando eu disse que eu não ia usar longo? E eu nem tô de tênis como eu prometi a muitos anos atrás. Estranho isso agora. E você fica tão lindo de terno como eu disse que ficaria. Dançar com você é tão fácil... Tua mão na minha cintura, e meus braços envolta do teu pescoço. Eu tenho que me controlar pra não chorar, porque isso é tudo que eu sempre quis. Eu e você.

Dublando a letra da música, com a testa encostada, dançando lentamente, num momento que não acaba, e todos sorrindo, e alguns parentes chorando e amigos bebendo, e todo nosso futuro na palma da nossa mão. Pra sempre.

Eu aceito ter você para o resto da minha vida. É tudo que eu mais quero.

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Aos meus Amores, Amantes, Amados, e afins.

Meus. MEUS.
Meus e de mais ninguém.
Por hoje e só.

Elementos.

Para as mechas de cabelo colorido, meu peito nu contra o teu. Sorriso que vacila, que cresce, que some. Tudo escuro, teu olhos na noite. E você não sente, não me sente, não se senta. Inquieto, e eu roendo os dedos, porque as unhas já se foram a tempo. Os cafés e a fumaça invisível na varanda. A pouca vodka com muito gelo, muito desdem com pouco caso. Cospe, bate, range os dentes lindamente tortos, e não chora. "Chorar?" Livros, dezenas deles, centenas juntando os meus com os teus. Teus dedos gelados sempre. Caneta, e papel, e tinta na pele, e pele na boca. O verde, das árvores, da camiseta, do lápis, do olhos, da casa. O rosa das bochechas e dos mamilos. A nossa flor mais bonita, cara desmaqueada na manhãzinha, ódio puro. Dentes, mordidas, garras, roxos, risadas bêbadas. A gente. A igreja queimando na mente. Aos triplos, aos quadrupolos. Tiros no escuros, brincadeiras infantis, roupa velha e vestido caro. Milhares de gostos de bocas diferentes, beijos gelados de sorvete de butiá, horas no deck olhando um céu azul que não existe mais. Os chicletes que não me deu, o guaraná. A praça, o retrato (que eu sei que usa com foto de outro alguém).

Água.

Aos presentes que nunca foram dados, os desenhos feito a mão, e as cartas. Fita do lado do cabelo da outra menina, e minhas calças rasgadas no joelho quando eu cai de bicicleta. Cheiro bom, perfume barato. Letra feia que tu não entende, aqueles textos meus que tu não entende mais diz amar, e os grandes demais que lê pela metade. O fim era pra ti. Perca de pontos e virgulas, perca de tempo. Tua língua dançando com a minha, as horas jogando. Teus braços, meus abraços. Fotos, espinhas, cabelos crescendo, A última música, o último filme, beijo e colo. Nariz escorrendo. Frio.

Fogo.

Colchão contigo, cantar baixinho, nariz com nariz. Dedos pela coluna, braços, suspiro no ouvido. Gemido. Arrepio. Ciúmes! Muito ciúmes. Todo o ciúme do mundo. Sinuca, sofá. Olhos revirando. Beijos na testa, nos braços, na boca. Lábios rosados. Andar de carro. Fugir de carro. Entrelaçar de dedos. Mentir. Sentar na escada. Morango. Ah, como tu é doce, delicada. Falta de dinheiro, calcinha vermelha. Blusa caída, vergonha. Pescoço e panturrilha. Mãos por todo o corpo. Fotos só as tuas. As palavras bonitas e complicadas sem sentido. Textos e indiretas. Estuda comigo?

Ar.

Internet, muito da internet. Redes sociais, entrevistas, fotos, gostos estranhos e iguais. Muita mentira, muita traição. De amor, de confiança... tipo diamante quebrado. Webcam, pimenta. Queria poder voltar pro teu colo e pros dias antigos. Cappuccino, sete de setembro. Shows desconhecidos, festas, danças promiscuas, dedos onde não deviam estar. Olhos fechados, pescoço posto pra trás e tua mão na minha cintura. Barba roçando no meu rosto e gosto de cigarro. Sedução. Maldita abóbora arrependida. Confiar. Não confiar. Fim de tarde, fim do amor. Por-do-sol.

Terra.

Cueca, eu de sutiã e sorriso idiota. Pizza, sorvete, tererê. Lagrimas, chorando cachoeiras, cortes no rosto, cicatriz, a falta que você me faz. Lábios mordidos, feridas abertas, peito dilacerado. Acidentes de percurso, acidente de carro. Três tchaus em uma noite só, beijos desapaixonados. Cortina florida, cozinha cheia de gente despedaçada. O simples fato de eu não saber quem sou, quem tu é, quem tu foi e quem tu vai ser. Todos vocês. Toda eu. E você me abandonou. Eu te odeio.



Você ainda lembram de todas as coisas que passamos? Eu lembro. A primeira frase, a última também. A do meio e a que saiu pela metade.

Provavelmente você nem pensa mais em mim. 

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Madness II

Passei tempos, dias, meses, pensando nesse momento. Ah, Carol... se você soubesse. Meus olhos ardem, eu estou cheio de você, cheio do seu cheiro, todo esse tempo, cheio de uma fúria infinita que desconto a cada chute. Porque diabos você teve que me deixar? Tem muita coisa que eu queria que você soubesse, mas acho que não tenho muito tempo.

Você grita demais, mas aqui ninguém vai te ouvir. Além de mim. Podia ter ouvido antes, todos os prós e contras da minha mente, mas escolho isso. Você morrer.

Acho que eu nem sei porque estou fazendo isso. Que horas são? Um dia se quer me amou, princesa?

Ando pra lá e pra cá, segurando os cabelos mais compridos que o normal, começando a fazer cachos. Olhando pra você, seus cabelos lisos e loiros, caídos no chão, perto da parede, banhados do teu sangue... é quase arte. Todas as lagrimas no meu rosto, são suas. E as suas, que nunca chorou por mim antes... maldita. Querendo fugir? Não dessa vez. Te pego pelos ombros, e te jogo pro lado. Cambaleante se vai de costas no chão. Te chuto, chuto, todo o sangue que sai ela tua boca, e cortes, a sua falta de respiração. Me é apavorante, mas gosto da sensação.

- Eu sempre...amei...você! - minha voz sai como um corvo, entre os dentes cerrados.

Teus olhos castanhos, teus lábios rosados com esse batom que eu nunca vi. E teu cabelo ta com um corte diferente do que eu me lembro. Eu preferia o outro. E pra que toda essa maquiagem? Tu é tão bonita... Desde da ultima vez, eu desejava acabar com você, porque você acabou comigo. Desde a ultima palavra, aquele ódio quando joguei o vaso de flor contra a parede. Furioso.

Vou até a mochila, aquela velha que usei na viagem para a Europa contigo, e tiro minha arma, tremendo. Minhas mãos estão suadas demais, odeio isso. Tem um buraco no meu peito, desde o dia que tu foi.

Você caída, sangrando, chorando, tudo arte minha. Nem parece um dia a guria que foi minha.

- Carol.

Meus olhos prestes a chorar. Dentes cerrados, engatilho a arma.

- Gi-Gil..

Aponto a arma pra tua cabeça, eu não posso suportar ouvir o que tem a dizer, a ouvir sua voz, sentir a tua dor que eu tô provocando. Engulo a seco.

Fecho os olhos com força, gatilho apertado.

Não tenho coragem de abri-los, então mais uma vez engatilho a arma, e apontando pra minha testa, aperto o gatilho pela última vez.

O dia ficou vermelho, que nem o tom da minha fúria.

Madness

Todas os gostos amargos do mundo, estão agora espalhados na minha boca. Principalmente esse gosto de enferrujado, quente na minha língua. Esse gosto de vermelho. Eu consigo ver todo esse ódio nos seus olhos, me olhando, pegando fogo, brasa quente. A cada chute que me da, o gosto fica mais intenso, e eu sinto minha visão ficando turva. Eu não queria perder a visão agora, ver teu rosto enfurecido, é quase arte.

Eu não consigo ouvir meus próprios gritos, apesar de saber que são altos. Altos demais, que nem você. Cospe em mim, e senta em cima de mim, me desferindo socos no rosto, me batendo contra o chão. É assim que é o amor, afinal? Porque você sempre me disse amar, mesmo que eu fosse embora você disse que me amaria.

Porque tu tá fazendo isso? Que horas são? Quem é você, meu príncipe?

Se afasta, com as mãos na cabeça, andando pra lá e pra cá. Me encolho contra a parede, tentando me levantar, num impulso animal, eu sinto tanta dor que não sinto nada. Ah, minha perna ta quebrada. Todas as lagrimas que jamais chorei por você estão no meu rosto, no teu rosto, no chão. Eu tô até próxima da porta, eu podia... não, você me viu. Droga, me pega pelos ombros e me joga pro outro lado, com as costas no chão. Chutes, chutes, sangue, falta de respiração, tudo turvo, entorpecer.

- Eu sempre...amei...você! - me fala em cada chute.

Isso não é normal. Ou será que é assim o amor, afinal? A loucura do amor? Talvez.

- Tu fica aí, que tu não vai sair daqui. Não viva.

Teus olhos azuis nem são mais azuis, teu cabelo tá bem diferente do que eu me lembro de antes. Fazia quanto tempo que eu não te via? Uns quatro, cinco meses? Mais ou menos? Não consigo ordenar meus pensamentos agora. Mas esse cabelo não era assim, nem tinha essa barba. Tu sabe que eu não gosto de barba. Será que ficou pensando em acabar comigo desde nossa ultima conversa, que quebrou aquele vaso velho no corredor da minha casa, saiu furioso... mais furioso que agora.

Agora mexendo nessa mochila, tremendo, babando, com os olhos arregalados... Nem parece o homem que um dia foi meu.

- Carol.

Foco meus olhos nele, olhos marejados, olhos totalmente vulneráveis. E depois, na arma. Reluzente, engatilhada.

- Gi-Gil..

Aponta na minha testa, faz uma careta de ódio, engole a seco, mostra os dentes, com toda a fúria amostra.

Aperta o gatilho, com os olhos fechados.

O dia ficou vermelho, que nem o gosto quente na minha boca.

sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Metade de mim é amor

- Aonde tu tá?

- Hm, no centro.

Eu nem te conhecia direito na época, não sabia toda a diferença que você ia fazer na minha vida, mas eu já gostava quando me ligava pra falar bobagens. Eu gostava da tua voz. Queria agora poder lembrar dela, mas tudo que eu lembro são teus olhos azuis.

-Perto aqui de casa? - me perguntou, e garanto que estava sorrindo, só pelo teu tom de voz.

-Hm... mais ou menos. Tô pra cá da praça do centro já. E já to indo pra casa, tá ficando tarde. - com os braços cruzados, equilibrei o celular no ombro e na orelha. Dei uma olhada no relógio do pulso, e vi que já passava das sete e meia.

- Quer que eu te leve pra casa?

Eu queria, claro. 

Encostada na parede de fora do meu sebo preferido, com uma sacola de livros velhos - mas novos pra mim - nas mãos. Fiquei olhando a chuva fina caindo de leve.

- Que isso! - fiz uma contradição da minha própria vontade. - tá chovendo, não quero incomodar, não precisa.

- Eu não me importo com a chuva. Tem certeza?

- Tenho, tenho. Sério, não precisa.

- Ah, tá bom... tchau. - senti uma pontadinha de decepção na voz dele.

- Tchau.

Desligou. Fechei o telefone, e joguei dentro da sacola de livros.Baixei a cabeça e encarei a chuva fina e fria.

Como posso ser tão estúpida ao ponto de recusar que ele me levasse até em casa? Andei mais rápido do que o normal, engolindo a tristeza e decepção de mim mesma. Mordendo o lábio, pensando em possibilidades absurdas se eu tivesse aceitado a companhia dele.

De longe, ouço passos de corrida atrás de mim, claro, com a chuva aumentando desse jeito. Os passos vão diminuindo enquanto se aproxima de mim, e quando olho para o meu lado, ele, sorrindo, com as mãos pousadas nos joelhos recuperando o folego, e me olhando com os olhos azuis muito claros. Um sorriso bobo.

- Uau - deu uma pausa pra puxar o ar - você anda bem rápido.

- Não acredito que você veio até aqui correndo! - ri, abraçando-o.

- Se você quiser, posso voltar pra casa e... - falou apontando o polegar pra trás, sorrindo pra mim.

- Para de bobagem. - dei mais um abraço dele, sentindo o cheiro do perfume no pescoço.

Ele me deu a mão e andamos na chuva, conversando pouco e se olhando muito. Foi uma caminhada de uns 10 minutos até a esquina da minha casa.

- Obrigada por vir. De verdade.

- Não tem problema, madame. - ele sorri.

- Então tchau.

- Tchau.

Me olhou nos olhos,crispando o lábio, e virou as costas indo embora, olhei por uns segundos ele ir, e virei as costas pra ir embora, mas antes de dar o primeiro passo ele me chamou, voltando correndo.

-Hey!

Me puxou pelo braço e me beijou na chuva, em baixo apenas da luz da lua. Eu me perdi no mundo por alguns segundos. Tudo que eu sentia era o gosto, o cheiro, o toque, o abraço, a língua, os olhos fechados, a alma.... Quando ele me soltou de seus braços, eu ainda estava de olhos fechados, e um tanto tonta.

Ele sorriu, se afastando, sem dizer nenhuma palavra. Não que eu ache que precisasse de alguma palavra. Estava tudo feito.

Devo muito a ti e aquele dia. Foi ali que eu descobri que eu podia ter em quem confiar, um abraço e um ombro amigo. Foi ali, que, na primeira vez me senti amada de verdade. Me senti num livro, como os que eu carregava. Eu tinha descobrido o que era amor.

The Doors

Eu não gosto quando as coisas ficam nubladas na minha cabeça. Geralmente eu consigo lembrar de todos os fatos com clareza, todos os detalhes frescos. É fácil, quase um vício. Ter uma boa memória sempre me ajudou a escrever.

Não é o caso.

Tinha um porta, eu de um lado, você do outro. Eu sei que porta é essa, mas no momento, nas minhas lembranças era como e fosse uma porta prendida ao tempo e ao espaço, uma porta ou um portal. Você carregava em seus ombros algo realmente pesado. Uma caixa? Um amplificador? Todos as tuas dores e seus pecados? Não sei. Ridiculamente, mas minhas mãos papéis leves, que nem minha alma naquela época. Um contraste estranho.

Quando eu dava um passo a frente, você fazia o mesmo. Quando eu abria espaço pra trás, você fazia o mesmo. Uma sincronia idiota que durou menos de dez segundos, mas que foi suficiente pra arrancar esse teu sorriso no meu, minha timidez na tua.

"Oi."

"Oi."

Daí você passou, e eu também, e a mágica se desfez e tudo agora é tão nítido que não me tem mais graça.

A segunda porta que eu te vi, foi na minha, acompanhado de gente que eu conhecia tão pouco mas fiz questão de comentar algo estupido, pra que tu notasse minha presença. Não precisava disso, vi teus olhos em mim, assim como os meus em ti. Disfarçando, lentamente, encostado na parede com seus fones de ouvido branco, fazendo um solo de bateria invisível, vestindo seus all star azul e sua flanela vermelha.

Te vi através de uma porta de vidro, outro dia, também. Sentado no banco, com um livro no colo. Bem concentrado, sentado totalmente largado bem do jeito que eu faço.

Na porta de elevador, me sorrindo e me dando bom dia, perguntando o meu nome, ou acenando pra mim da porta do prédio.

Muitas portas. Muito eu e você.

domingo, 25 de setembro de 2011

Preview

Me empurrou, e eu cai do meio fio que eu me equilibrava.

- Para, como tu é chato!

É um daqueles meus rituais, de quando eu era pequena, andar no meio-fio da rua, equilibrando-me ali como se toda minha vida dependesse disso. Ele nem liga muito para o que eu ligo, me empurra sem meu consentimento. Me irrita tanto esse sorriso constante, esse sorriso torto e todo debochado, esses olhos semi-cerrados por causa do sol, esses braços cruzados no peito em baixo da manga curta verde, esse cabelo que eu mesmo baguncei.... Me irrita.

- Tu que é um porre, guria.

Continua sorrir, e rir, e eu faço uma careta de desaprovar. Ele não é muito de ligar e sustenta o sorriso. 

Maldito.

Dai, daqui a pouco eu nem lembro porque eu tô brava com ele. Ele sorri tanto que faz eu me esquecer do...

do que eu tava falando mesmo?

domingo, 18 de setembro de 2011

Pra você:

não é que

eu precise

de você; eu

só preciso

de alguém.

Limbo me é.

Eu já nem existo.

Agora, tudo o que eu fiz na minha vida, todas as minha ações, movimentos, conquistar, sorrisos, tristezas, são nulas. Todos os passos que eu dei na minha vida, não fazem mais sentido. Respirar não é necessário, apesar de eu tentar fazê-lo aqui no limbo, por puro instinto. Aqui não existe ar, e a única coisa que eu sinto é uma queda infinita. Não tenho roupas no corpo, nem pelos no corpo, é como ser um bebê novamente. Nenhum som é emitido aqui e estou completamente sozinha. Diferente de quando em vida, agora eu até aprecio a solidão. Me deixo cair de todas as maneiras. Mas eu gosto de esticar as pernas e os braços pro céu (não é bem o céu, você entende, pra cima) e cai em gravidade zero com as costas para baixo. Eu não enxergo nada, não sinto nenhum cheiro, mas ironicamente sinto um gosto familiar na boca: picolé de uva. Aquele picolé de uva feito em casa pela minha vó, no sitio que a muito tempo eu não tinha uma lembrança se quer.

Agora me lembro das coisas mais absurdas, que antes pareciam tão insignificantes e esquecidas no fundo da minha mente. Como aquele cavalo marinho rosa de pelúcia que eu andava para cima e para baixo, quando criança. O meu primeiro beijo com um idiota qualquer, quando eu caí perto do garoto que eu gostava, quando eu estava deita na na grama, olhando as nuvens da noite se moverem lentamente tapando e destapando as estrelas que piscavam monotonamente. Eu queri sorrir lembrando dessas memórias, mas eu não comando mais no meu corpo. Eu só sou alma.

Lembro agora de cair no lago. De não saber nadar. De não ter ninguém por perto, me afogar, e morrer. Simples assim, morrer.

Morrer não é tão dolorido quando eu pensava, mas também não tão tranquilo quanto diziam. Mas como eles podiam dizer, se estavam todos vivos? Tão idiota pensar nisso agora. Afinal, será que isso ainda ode ser considerado pensar? Agora fico aqui considerando que todas as coisas no mundo não existem, e era tudo um sonho. E eu acabei de despertar. Agora ficarei assim pra sempre, até dormir de novo e acordar em uma nova vida. Talvez seja isso a vida e a morte. Talvez eu esteja sonhando nesse exato momento. Tantos talvez.... e eu que achei que teria todas as certezas, todas as respostas quando morresse. Idiota, eu.

E agora as outras pessoas que estão vivas e eu não (ou no meu sonho que acordei). Minha mãe, pai, amigos, namorado... Antes eu era Aline, agora eu sou o Limbo, e o Limbo me é. Vou esperar. Tenho muito o que pensar, muito o que desvendar dentro da minha própria mente, coisa que nunca fiz em vida. Nunca parei.

Boa noite.

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Encaixe

Entre o teu, e o gosto do cigarro, escolhi o segundo.

Não por vaidades, mas um pouco de ego. Essa falta de respeito, esse ódio todo me explode de vez em quando. Não é de proposito, apesar de saber que tudo que tu fala é.

Entre me apaixonar e falar, preferi negar.

Se eu perder, perco sozinha. Se ganhar aí só eu que ganho, como diria Ana. É que o problema não é nem eu, sabe? É você. Toda a burocracia, toda aquela merda de amor. Não é pra mim, muito menor pra você.

Entre acompanhar teu ritmo, fui embora.

Tudo é muito diferente, tua voz da minha, o jeito que olhamos pras coisas e todo o mundo em si. Será eu que tô vivendo num mundo muito paralelo, imaginando coisas fora do real? Eu querendo cobrar de você, coisa que você nunca me deu e nunca vai poder dar. Nem pra mim nem pra ninguém.

Nossas mentes não encaixam.
Não vou mais tentar
me convencer do
contrario.

terça-feira, 13 de setembro de 2011

Foda-se o romance

Tinha um céu azul sobre nossas cabeças, e uma grande nuvem fofa branca, feito algodão. Eu fiquei observando-a ser levada pelo vento marítimo, bem quando eu tinha uma melodia na cabeça, mas eu não conseguia lembrar a letra da música.

Sentamos na ponta do pier de madeira. Como eu queria que ele tivesse pegado na minha mão, olhado pra mim de uma forma diferente... mas ele só fazia falar, falar muito. Eu, no mais, ouvia. A vezes nem ouvia, só ficava observando-lhe os traços do rosto se movendo, e sues lábios, e dentes e quando seus olhos se encontravam comigo. Eu me perdia bastante, aquele costume de fazer que sim com a cabeça, mas nem saber do que se trata. Eu até que sei disfarçar, mas tenho meus deslizes.

- Hein? - ele falou.

- O que? - perguntei, me dando conta que estava perdida nesses pensamentos em vez de prestar atenção no que ele falava. Ele riu.

- Perguntei se tu gosta da praia. - Falou olhando pro mar, que naquele dia estava num azul tão escuro que não conseguia nem ver as pedras mais superficiais e altas do mar. O mar batia violentamente contra os troncos do pier, e eu sentia os respingos nas minhas pernas e pés.

- Não gosto.

Me olhou confuso, franzindo as sobrancelhas grossas.

- Porque tu tá aqui então?

- Porque eu gosto de você, não da praia. - Me olhou fixo por uns momentos, e depois soltou um sorriso irônico, e balancei a perna demais pela ansiedade, meu chinelo caiu no mar. Fiquei olhando meu chinelo vermelho boiar por uns segundos, e depois ser engolido no mar. - mas que merda.

Levantei no pier, e joguei o outro pé no mar. O que eu ia fazer só com um chinelo só? Ele falou um bocado mais, mas eu não prestei atenção. Acho que ele sabe que eu não presto atenção, as vezes, mas continua a falar apenas pela necessidade de ter um ouvido. Eu gosto de sorrir, e acho que isso basta pra ele. No final, eu nem estava mais pensando nele, nem na voz dele, nem no sorriso, nem em mim.

Só no chinelo.

28 reais no mar.

Mas que merda.

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Minha dor Gabriela.

Lembro da Gabriela, sentada contra o sol, com a cabeça encostada na parede, o cabelo caindo sobre o rosto, apenas com aquela regata desgastada cinza, e a alça do biquíni rosa destacando-se na pele branca. Lembro do cheiro do sal marinho, de mastigar a areia sem querer, e o chão da sala de madeira. A gente tinha preparado um chimarrão, mas Gabriela nem tava muito ai pra isso, ela gostava mesmo era ali do sol dourado do fim da tarde, se escorregando pela parede pra deitar no chão, meio torta, com os cabelos espalhados que pareciam fazer parte do assoalho antigo da casa quase vazia.

Eu só olhava, não podia fazer muito mais nada. Tomava um chimarrão, contava alguma coisa sobre a noite assada e Gabriela só fazia sorrir, e abrir os olhos um pouco, depois tornar a fechar. Olhos tão mais cansados que os meus. Olhos mel. E aqueles cílios. Convido Gabriela pra qualquer coisa, mas ela diz que quer ficar deitada mais um pouco no sol, não quer ir no parque, não quer sair pra beber, não quer ir pra casa.

- Eu gosto do teu chão. - Ela me ri uma risada quase sarcástica, sedutora, coisa que ela fazia sempre.
- Eu gosto de você.

O silencio. Seriedade no rosto de Gabriela por segundos que pareceram décadas pra mim, e depois um sorrisinho, e sol atrás de um nuvem. Gabriela se arrasta no chão até meu colo, e escala meu corpo, poem seus braços a redor do meu pescoço e gentilmente beija minha testa, meus olhos, meu nariz, bochechas, maxilar, minha alma. Gabriela é daquelas que faz sem ter motivo, não é de proposito, ela só faz porque sente.

Se deita de novo. Já é seis e meia passada.

Conversamos pouco, rimos muito, até que aquela voz, chama Gabriela por detrás do muro de minha casa. Gabriela levanta, passa a mão nos meu cabelos, bagunçando-os e nem se despede.

E lá se vai minha Gabriela, de mãos dadas com outro homem. Beijando uma boca que não é minha. Gabriela se vai, mas eu sei que amanhã, ou depois, minha Gabriela vai voltar. E quando voltar, vai ser minha.

terça-feira, 23 de agosto de 2011

Uma carta pra ninguém (você morreu).

Vagamente, as borboletas.

Sem outros insetos, só consigo me lembrar das borboletas. E a grama úmida de sereno, entre meus dedos e os seus, entrelaçados, das mãos, dos pés. Mas só em alma. A tua alma, a minha e as das borboletas.

Se lembra quando você me disse que animais tinham alma? E as borboletas...?

Acho que sim. Aliás, acho que são só almas por si só. Ou talvez nem existam.

Tinha chovido, lembra? Roupas molhadas, o cheiro da terra e da grama. Grama úmida entre nossas almas. Almas entrelaçadas.

Tenho saudade do tempo que você me amava, que você existia. Porque partiu?

Essa saudade...

Agora só sobrou eu.

Eu sozinha, e as borboletas.

sexta-feira, 24 de junho de 2011

Sentir de verdade.

Não passavam de dois corpos e duas verdades. Ou uma só, depende do ponto de vista. Ela já tinha parado de se ver com ele como duas pessoas, e se via com ele como um ser único. Ela se sentia assim, não tinha culpa, era involuntário. E gostava.

Ele nem sabia o que pensar. Não pensava muito quando estava com ela, a não ser nela mesmo. Não via mais nada a não ser ela. Alimentava-se dela, bebia dela, sentia dela, banhava-se dela, vivia dela e de mais nada. Ele se sentia assim, não tinha culpa, era involuntário. E gostava.

Tanto faz, ela diz. Você que sabe é a frase preferida dele. Ela da um sorrisinho de canto, sabe do jeito dele, e vai levando assim, devagar, sem pressa, sem problemas. Nunca entendem o que o outro quer dizer, mas se entendem perfeitamente.

Tudo encaixa.
O corpo encaixa.

Ele sentado na borda da cama, com a testa apoiada nas mãos, e os cotovelos pressionados contra as coxas. Parece preocupado, mas só parece. É verão, e está só com bermudas jeans, de um tom de verde que ela gosta. Deitada na cama, observa o sol batendo nas costas dele, iluminando-o como um anjo. O seu anjo. Se aproxima, engatinhando, sorrindo, apenas de short jeans, não importa, estão sós em casa. Na casa deles. A casa tão sonhada. Felicidade pra sempre. Abraça-o, por trás. Desliza as mãos e os braços pelo o peito nu dele, acaricia-o devagar, com a ponta dos dedos e depois com toda a palma da mão. Ele quase não se move, mas sorri. Ela encosta o rosto no ombro esquerdo dela, e aprochega o corpo, encaixa os joelhos em cada lado da cintura dele e lhe beija devagar o pescoço. Sente o sol na pele, sente a pele dele na sua pele, sente muita coisa, coisa que nem sabia nomear, e nem sabia se de fato tinha nome.

Não tem fim todo o sentimento.
Nunca tem.
O que eu tenho a dizer?


É muito amor.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

O trem e a passageira.

Senta do meu lado, mas não me olha.
Eu olho.
Sorriso debochado, de quem sabe que eu gosto.
Eu gosto.
Movimentos delicados, muda a posição da perna por debaixo da saia.
Pregada.
Sorri, poem os fones de ouvido. Move os lábios, mas nenhum som saí.
rosada.
O trem está cheio, mas eu não sei respirar. ela sabe.
Sorrisos.
Encosta a mão na minha, como se fosse sem querer. Umedece os lábios com a língua.
Coração disparado.
O trem para. Se levanta. Saí. E eu nunca mais a vi.
Nunca mais.

A bebida mais pura.

Me dá um gole desse teu amor, tão valioso. Quero teu amor escorrendo pelo canto dos meus lábios. Me de um pedaço do teu corpo, ou então, ele todo. Quero me perder nele, como quando você se perde, deitado na cama, banhado pelo sol, de olhos fechados... no mar. Eu quero todas essas músicas que saem dos seus ouvidos, vozes, e batidas, e coisas que eu não entendo e coisas que eu quero entender e coisas e mais coisas. Eu quero ver tuas pupilas, teus olhos verdes me olhando feliz, me analisando, e eu sendo só tua.

Me dá um gole desse teu ódio repentino, me mostra seus socos na parede. Suas palavras, me jogando na cama, com raiva, com amor, com raiva. Me mostra como é ser você, me mostra todo o teu sentimento, aquele mais... mais que eu não sei. Eu quero teu perdão. Eu quero teu sim e o teu não. Eu quero tudo teu.

Eu quero ser sua. Eu quero você bem e você...você ainda me ama?

Me dá um gole de sentimento.

sábado, 23 de abril de 2011

Do Amor.

Todas aquelas coisas boas que eu já senti, estão em um sorriso. No seu sorriso, no seu olhar. Eu só consigo imaginar meu futuro com você. Não importa como, não importa quando, mas é com você. Todos aqueles sonhos bonitos com você, todos os sonhos que eu vou viver com você.

As vezes me pego, sentada ali, enquanto eu observo as pessoas felizes, pensando em você. Eu já não invejo essas pessoas como eu fazia antigamente, pois agora eu te tenho. Hoje, amanhã, pra frente e pra sempre. Infinito. Eu não tenho mais porque invejar ninguém, porque eu sou a pessoa mais feliz do universo, da imensidão. Você me fez assim.

Tudo faz mais sentido.

Daqui pra frente, eu e você.

Eu te amo.

quarta-feira, 20 de abril de 2011

Vou dar o tempo ao tempo

É engraçado, o modo como venho me portando comigo mesma. Como se eu não ligasse pra certos erros meus, como se pequenos sorrisos fossem melhorar tudo, ou como se fechar os olhos é a solução.

Não tenho mais minha musa.
Não encontro.
Estou bem perdida, e assim acho que fico. Por um tempo. Bom tempo.

segunda-feira, 18 de abril de 2011

É o fim

Por muito tempo, eu passei me afogando na minha própria lama. As vezes, é preciso cair de um lugar muito alto pra perceber o que se tem, e o que você já perdeu. Eu caí, e a queda, maldita seja, parecia gigantesca, sem fim. Era eu, caindo infinitamente na imensidão que era a minha solidão. O baque no chão foi surdo, mas doloroso. Daqueles que ninguém em volta percebe e você tem tempo o suficiente pra levantar sem que se preocupem ao seu respeito. E quem estaria lá se preocupar se eu não tenho ninguém?

Quando eu levantei, tudo era bem escuro. E sentia algo entre os dedões do meu pé, gosmento, frio, mas não pude ver o que era. Eu não tinha certeza se estava muito escuro, ou se agora eu era cega. Estiquei os braços procurando apoio, e o vazio me abraçou. Me tomou conta, como um vento gelado a noite que corta a pele sem aviso. Desabei ao chão e a chorar. Porque logo eu? Eu que tinha ajudado a todos, e agora sozinha, ninguém estendia a mão pra me buscar? Eu tinha que encarar o fato: Eu estava sozinha. Eu era sozinha. Eu ia ser sozinha pra sempre, e iria morrer, pois o liquido em meus pés, era meu próprio sangue.

quinta-feira, 17 de março de 2011

Torpor

Hoje me sinto estranha. Na verdade, hoje eu não estou me sentindo. Não é a mesma coisa do "não estou me sentindo bem" de todos os dias, noites e afins. Eu não estou me sentindo, mesmo. Não sinto bem, nem mal, nem feliz, nem alegre, nem nada. O mais perto de me sentir é dopada. Num torpor infinito de minha alma, causada por coisas que desconheço. Eu não estava assim, realmente esta manhã. E eu não fiz nada diferente dos meus dias normais, então não sei o que tenha causado. Dormi no começo da tarde, e então, acordei, olhando pro ventilador, parado. Parado e me olhando como se dissesse " sou mais importante que você". Que sentido isso faz? Nenhum. Levantei, me sentindo anestesiada da cabeça aos pés. Talvez ainda fosse o sono da tarde que me deixasse assim, então resolvi tomar uma ducha. Então, revelação (pra mim): Eu não sentia muita coisa, eu toquei meu corpo em uma tentativa frustrada de acordar da minha hibernação imaginária, mas não adiantou. Belisquei-me, arranhei-me, torturei-me mentalmente. Mas nem isso fazia parecer que eu (físico e mental) ligasse. Desliguei o chuveiro com aquele pensamento bobo de "será que eu morri?". "Será que eu morri e isso é uma ilusão maligna de Minh'alma, fazendo que eu acredite que ainda estou viva?". "Com certeza morri.". "Eu não posso morrer, eu não posso ter morrido!". Vários pensamentos, varias espontaneidade mentais idiotas, mas nenhuma delas me parece dar a resposta. Nenhuma delas me faz ter certeza de alguma coisa desse dia. Será que eu estou sonhando com isso? Não me parece um sonho. E eu não lembro com o que eu sonhei. Só lembro de ter dormido de porta aberta (feito raro), então deveria estar realmente cansada. Venho mesmo me sentindo cansada nos últimos dias, talvez isso seja só uma consequência. Só me pergunto, até quando essa melancolia insensata vai tomar conta de mim? Até quando eu vou levar minha vida sem sentido até a beira de um precipício qualquer? Até quando eu vou viver morta? [...]

Mas,
Eu morri.
De alguma forma,
Em alguma parte da linha do tempo,
Eu morri.

Eu vou morrer.

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

engasgada.

Estou me sentindo cada vez mais sem mim. Como se eu estivesse me esvaziando, ou apenas escorrendo pelas minha próprias mãos. Não consigo me manter em pé, como antigamente. Não tenho tantas bases, tantos portos, não tenho os meus amores. Não que eu tenho perdido-os, mas sentir essa solidão, essa agonia não é pra mim. Sinto meu coração bater devagar, meu sangue escorre nas veias preguiçosamente, minha cabeça não pensa tão bem quanto antes. Meus textos não são tão bons, e nem tenho mais tantos leitores. Era a única coisa que talvez me mantivesse feliz, ter algo pra fazer, e fazer bem: escrever. Mas sinto perder isso a cada dia mais, e a culpa é só minha.
Eu.
Eu me afundando.
Eu me afundando em mim.
E adorando odiar isso.

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

I'm not okay.

Esperei um mês.

Não, minto. Esperei por dois, mas digo que foi um por generalização. Talvez eu não queira dramatizar o que já é um drama por natureza. Pela minha natureza.

Ele prometeu que ia voltar seja lá para onde tinha ido. Não contou pra onde ia para a minha proteção. Minha proteção? Ele só podia estar brincando.

Ele era a unica base e fortaleza que eu tinha, e o pior de tudo é que ele sabia.

Talvez, ele tenha finalmente fugido de mim, e por medo disse que ia voltar, talvez assim de ficar esperando-o eu demorasse mais alguns dias pra me matar, e não assim quando ele cruzasse a porta.

Engano dele.
Eu não quero me matar.
Quero matá-lo.

Agora sabemos quem diabos precisa de proteção.